MoMA exibe a moderna fotografia brasileira

O Estado de S.Paulo
[Por Antonio Gonçalves Filho]
08 de outubro de 2020



Museu norte-americano abre em 2021 exposição Fotoclubismo: Brazilian Modernist Photography, 1946-1964

Maior exposição da moderna fotografia brasileira montada fora do País, a mostra Fotoclubismo: Brazilian Modernist Photography, 1946-1964, que será aberta em março do próximo ano no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), terá 140 fotos de 60 fotógrafos do histórico Foto Cine Clube Bandeirante (FCCB), grupo de amadores que representou o ápice do movimento fotoclubista no Brasil, atividade que se propagou, nos anos 1940, pelas principais capitais do País. A curadora da mostra, Sarah Meister, uma entusiasta que ajudou a ampliar a coleção de brasileiros no museu norte-americano, concedeu uma entrevista ao Estadão em que destacou a importância de fotógrafos modernos como Thomas Farkas – o primeiro a entrar no acervo do MoMA, em 1949 –, Geraldo de Barros, German Lorca, Gertrudes Altschul, José Yalenti e Marcel Giró, entre outros.

A ordem dos nomes citados não corresponderia, na época do Foto Cine Clube Bandeirante, à rígida hierarquia adotada para classificar os sócios nos anos 1940. Eles eram considerados novíssimos, júniors e seniors, dependendo do nível em que se encontravam – os autores do livro A Fotografia Moderna no Brasil, Helouise Costa e Renato Rodrigues da Silva, consideram o fotoclubismo uma atividade de caráter elitista, visto que a condição do fotógrafo clubista, segundo os autores, “era a do profissional liberal que, dono de uma situação financeira privilegiada, podia se dedicar à fotografia em suas horas vagas”. Em todo caso, alguns fotógrafos modernistas não se encaixam nesse perfil – e um bom exemplo é German Lorca, ainda ativo aos 98 anos, que trocou a profissão de contador ao abrir, em 1952, seu primeiro estúdio fotográfico.

“Desde a invenção da câmera Kodak, em 1889, fotógrafos com ambição artística lutaram para se distanciar do trabalho de amadores ou de simples profissionais interessados apenas em produção. E, como no caso de nosso contemporâneo Instagram, dentro do Foto Cine Clube Bandeirante havia muitos fotógrafos inventivos, ambiciosos, produzindo trabalhos inesquecíveis, enquanto outros eram menos originais”, avalia Sarah Meister.

O desafio para a curadora, ela admite, foi evitar que seu julgamento privado distorcesse o papel dos fotógrafos e seus respectivos trabalhos associados ao Foto Cine Clube Bandeirante. “Enquanto sinto ser muito importante para a exposição transmitir ao público o sentido da diversidade que caracterizou o clube, é igualmente essencial permitir uma apreciação mais detalhada dos trabalhos das figuras importantes desse cenário. No final, o centro da exposição e do catálogo que a acompanha são seis artistas que receberam considerações monográficas: Geraldo De Barros, German Lorca, Gertrudes Altschul, José Yalenti, Marcel Giró e Thomaz Farkas. Esses fotógrafos são artistas singulares, cujo trabalho merece maior reconhecimento, particularmente fora do Brasil.”

O movimento fotoclubista paulista foi, de fato, inovador a ponto de estabelecer parâmetros estéticos que definiram o modernismo fotográfico brasileiro e se afastaram tanto da fotografia documental do século 19 como do fotopictorialismo dominante no começo do século passado. Os membros do Foto Cine Clube Bandeirante souberam aproveitar a maré favorável do desenvolvimento industrial do País no pós-guerra, embora a curadora Sarah Meister estranhe o reduzido número de fotógrafos que acompanharam o nascimento da nova capital, Brasília, fundada sob o signo dessa nova era.

“É curioso como a fundação de Brasília foi quase ignorada pelo Foto Cine Clube Bandeirante”, observa a curadora. “Quando Farkas fotografou a nova capital, ele já não era mais integrante do clube, e as únicas imagens que aparecem no boletim (a revista mensal do FCCB) são uma página de propaganda da Kodak, de janeiro de 1961, e ‘Sentinela’, de um membro júnior chamado Mamede F. Costa, em julho/agosto do mesmo ano.”

Thomas Farkas não foi pioneiro só no registro da nova capital. Ao ingressar no Foto Cine Clube Bandeirante, por volta de 1945, ele ficou conhecido por seus enquadramentos anticonvencionais e ângulos insólitos. Outro que seguiu esse caminho e acabou fazendo novas experimentações foi Geraldo de Barros, o pioneiro do FCCB (ele entrou no clube em 1949) a realizar intervenções no processo fotográfico tradicional, enveredando por um caminho que o levou ao abstracionismo por meio de múltiplas exposições, cortes em cópias acabadas e simulação de uma outra realidade nessas variadas interposições.

Não se conclua por esses dois nomes que o FCCB fosse um Clube do Bolinha. Houve muitas Luluzinhas igualmente ousadas, que também gostavam de fotografar e estão na exposição do MoMA organizada por Sarah Meister. “As aquisições de fotos de artistas ligados ao FCCB incluem diversas artistas mulheres que considero do primeiro time, como Gertrudes Altschul, Dulce Carneiro e Barbara Mors”, diz ela.

O MoMA, segundo a curadora, tem mais de 30 mil fotos em seu acervo, desde os pioneiros da fotografia moderna na França (Eugene Atget, Cartier-Bresson) até norte-americanos como Walker Evans (o grande fotógrafo da Depressão) e Garry Winogrand (conhecido por suas fotos de rua). “Nas décadas mais recentes, temos feito esforços para ampliar nossa coleção com foco em regiões fora do eixo EUA-Europa, o que explica o crescimento dos latinos no acervo”, relata a curadora, citando recentes aquisições de obras de artistas brasileiros contemporâneos como Regina Silveira, Rosângela Rennó e Sofia Borges. “Vale lembrar que temos imagens registradas por Cláudia Andujar dos anos 1960”, cita a curadora. A primeira foto brasileira (de Farkas) entrou na coleção do museu americano em 1949 graças ao interesse do então diretor do MoMA (e também fotógrafo) Edward Steichen (1879-1973). Depois foi a vez de Geraldo de Barros (em 2005). Todas as outras fotos brasileiras foram compradas depois de 2013.

“Acho fascinante que, embora os pioneiros modernos brasileiros estivessem ligados aos avanços da época – e mais diretamente a Otto Steinert (fundador do grupo Fotoform) e outros associados à fotografia subjetiva –, a ligação deles com fotógrafos norte-americanos se restringiu a amadores. Aparentemente não tinham contato com Harry Callahan ou Aaron Siskind”, conclui a curadora.

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Fotografia Moderna 1940-1960

ARTE!Brasileiros
[Agenda]
01 de agosto de 2019


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Pela primeira vez, reúne-se em um casa modernista em São Paulo – a residência Castor Delgado Perez, de Rino Levi, sede da Luciana Brito Galeria – um conjunto expressivo de fotografias de Geraldo de Barros, Gertrudes Altschul, Thomaz Farkas, Ademar Manarini, Paulo Pires, Marcel Giró, Gaspar Gasparian, Eduardo Salvatore e Mario Fiori, representantes da vertente moderna da fotografia brasileira, linguagem que mudou radicalmente o conceito do que é arte no universo da fotografia e das artes visuais. Realizada em parceria com Isabel Amado, a exposição Fotografia Moderna 1940-1960 tem abertura em 29 de junho e pode ser visitada até 25 de agosto. Dado o interesse que esse período da produção fotográfica nacional tem ganhado na última década, Fotografia Moderna 1940-1960 propõe-se, com suas mais de 90 obras, a reunir fotos inéditas e outras que ainda não circularam ostensivamente e que, portanto, não são tão conhecidas do público. Com destaque para Geraldo de Barros, precursor do Concretismo no Brasil e cofundador do Grupo Ruptura, e Gertrudes Altschul, uma das poucas mulheres a ter a relevância de sua produção reconhecida neste período, a mostra espera contribuir, assim, para a ampliação do repertório visual que vem sendo construído em torno desses artistas. A fotografia moderna no Brasil aliou o desejo de inventividade e interpretação subjetiva do mundo no contexto do pós-guerra às especificidades dos movimentos de industrialização e urbanização brasileiros. Impulsionado pela fundação do Foto Cine Clube Bandeirantes, em 1939, o cenário da fotografia nacional observou uma efervescência única a partir da década de 1940, quando seus representantes se afastaram do pictorialismo academicista e abriram uma discussão sobre a essência do fazer fotográfico e sua autonomia enquanto forma artística em si e por si. São justamente os caminhos percorridos na busca por essa nova estética capaz de conferir à fotografia o estatuto de arte que podem ser vistos em Fotografia Moderna 1940-1960. Por um lado, essa investigação se deu no abandono de temas clássicos e pelo interesse pela abstração, pelo contrate entre luz e sombra, por cenários cosmopolitas e pela quebra de regras de perspectiva e composição. Em âmbito complementar, esses fotógrafos inauguraram uma visualidade marcada pela investigação dos recursos técnicos inerentes à própria mídia por meio de experiências laboratoriais e intervenções diretas no processo fotográfico como a múltipla exposição ou recortes de uma mesma chapa, a realização de fotogramas (quando os objetos eram colocados diretamente embaixo do ampliador, gerando fotografias sem a mediação de uma máquina fotográfica), superposições e desenhos executados diretamente no negativo. A fim de apresentar a autonomia do corpo de trabalho dos fotógrafos participantes – cujas obras integram o acervo de importantes instituições, como MoMA e Tate Modern – sem deixar de lado seus possíveis diálogos e pontos de contato, a expografia de Fotografia Moderna 1940-1960 divide-se em dois momentos. Enquanto a Sala Rino Levi da Luciana Brito Galeria é ocupada por ampliações vintage distribuídas de maneira tradicional, agrupadas por autor, no Anexo encontram-se as edições contemporâneas, reunidas por afinidades de assuntos, linguagens e temas. Assim, por exemplo, algumas das Fotoformas mais ilustres de Geraldo de Barros podem ser vistas ao lado de suas ampliações de desenhos sobre negativo com ponta-seca e nanquim, ou, ainda, as fachadas que beiram a abstração de Thomaz Farkas são acompanhadas não apenas por seu trabalho de interesse documental como também por experimentações surrealistas. De forma semelhante, fotogramas, estudos de composição e até naturezas-mortas vintage, além de ampliações contemporâneas de seus estudos arquitetônicos, representam a ampla gama do corpo de trabalho de Gertrudes Altschul na mostra.

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A aura, a reprodutibilidade e o vintage

ARTE!Brasileiros
[Por Tadeu Chiarelli]
24 de julho de 2019


Caixas de Luz, 1950, de Marcel Giró

Caixas de Luz, 1950, de Marcel Giró


O que diria Walter Benjamin se reaparecesse por aqui? Como reagiria frente à arte e sua reprodutibilidade depois, sobretudo, da internet e dos smartphones? Reveria sua crença na perda da aura da obra de arte diante da suposta desartização das obras produzidas com os meios tecnológicos? E quanto ao valor de culto da arte tradicional, Benjamin confirmaria que ele foi, de fato, suplantado pelo valor de exibição?

Entusiasta da propagação da arte pelos meios de reprodução, Benjamin via a fotografia e o cinema como fundamentais para a democratização da obra de arte. Reproduzida ou produzida por esses meios, ela seria finalmente despojada do prestígio ligado à sua suposta origem religiosa, possibilitando, assim, uma outra relação com o homem comum. Nesta nova situação, todos passariam a ser vistos não mais apenas como receptores, mas também como produtores possíveis.

Passadas décadas da publicação do ensaio de Benjamin, “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”, filas e filas se formam para ver de perto a Mona Lisa, de da Vinci, no Louvre (cuja imagem foi e é reproduzida inúmeras vezes) – para ficarmos apenas com um único exemplo ligado às artes visuais. Hoje filmes os mais diversos são “cult”. “Cult” é também o título de uma revista dedicada ao culto da cultura e de uma plataforma do Telecine on demand; “cult” é a cantora trans, como também “aquela” fotografia “daquele” fotógrafo.

Segundo Benjamin, a obra de arte tradicional trazia com ela o valor de culto por causa da aura que dela emanava: ela era única, preciosa mas, na medida em que perdeu essas qualidades, devido aos processos de reprodução, passou a ser igual a todos os tipos de objetos, restando-lhe apenas o seu valor de exibição, ou seja, sua capacidade de estar em todos os lugares.

Qualquer fotografia, portanto, teria como base o seu valor de exibição suplantando qualquer possibilidade de possuir ou vir a possuir algum valor de culto. Afinal em sua própria condição de existência, reina sua capacidade de se reproduzir indefinidamente, certo? Não, errado. Não há dúvidas de que as câmeras digitais acopladas a celulares estão levando a proliferação da fotografia a patamares até então impensáveis. Entretanto, ao mesmo tempo em que os smartphones transformam seus proprietários em produtores compulsivos de fotografias que se espalham e se exibem rapidamente por todo o globo, existem fotografias que têm seu valor intrínseco de exibição restringido, sendo a ele sobreposto o antigo valor de culto.

Existe no mundo um conjunto de fotografias cujo valor de culto é criado por terem como característica o fato de serem vintage (foram reproduzidas na época de sua captação pelos próprios autores, elevados agora à condição de artistas e não de “meros” fotógrafos), ou por fazerem parte de uma produção post mortem, porém com um número limitado de exemplares. São essas relíquias sobreviventes de um tempo heroico qualquer – construído pela história e/ou pelo mercado –, que nos fazem peregrinar por museus e galerias a prestar-lhes homenagens, que fazem com que nos desloquemos para esses templos a fim de compartilharmos com poucos o nosso deleite frente àqueles fetiches quase únicos, praticamente únicos.

Os advérbios “quase” e “praticamente”, neste contexto, alertam para um fato na prática inquestionável: postar-se diante de uma fotografia produzida, por exemplo, em 1939, e que teve apenas alguns exemplares produzidos por aquele ou aquela que captou a imagem, é como estar frente a uma pintura. E isso porque, hoje em dia, um exemplar de, por exemplo, seis reproduções idênticas produzidas há 80 anos – num mundo saturado de imagens –, é capaz de fazer emanar uma autenticidade, uma aura de mistério e revelação (não é isso o que os objetos votivos provocam em quem os olha?), que nos embriaga de puro deleite, como se ele fosse único.

Se fitar essas imagens raras é um deleite, possuí-las, então, é um sonho de poder e gozo. E, por mais cara que possa ser uma fotografia vintage, ou de restrita edição, quase sempre ela é mais acessível do que “aquela” pintura ou “aquela” escultura que sobretudo o colecionador médio nunca irá possuir.

Essas questões surgiram a partir da visita à Fotografia Moderna 1940-1960, em cartaz na Luciana Brito Galeria, em São Paulo. A mostra possui uma particularidade: apresenta obras de alguns dos fotógrafos brasileiros modernos mais prestigiados no espaço que antes foi uma residência projetada pelo arquiteto modernista Rino Levi. Difícil melhor container para abrigar alguns vintages de Geraldo de Barros, Thomas Farkas e outros, além de obras de uma única fotógrafa, Gertrudes Altschul. O espaço concebido por Levi traz solenidade às obras, dado que renova/amplia a aura que delas emana (embora a própria aura da casa também não deixe de impregná-las).

Se a exposição se inicia com alguma tibieza, com algumas obras de Paulo Pires, dentro da cartilha do que deveria ser uma fotografia em “estilo moderno”, logo na sequência ela passa a apresentar a dimensão experimental alcançada pela fotografia do período. Se na mostra se destacam os sempre estimulantes Geraldo de Barros e Thomaz Farkas, a grata surpresa foram as fotos de Marcel Giró, um modernista cuja produção mereceria ser mais divulgada.

Se os fotógrafos presentes na mostra, cada um à sua maneira, acreditavam que a fotografia poderia ser encarada e produzida como arte ou, mais como uma das “belas artes” (em alguns casos), não resta dúvida de que conseguiram provar que tais disposições eram possíveis, quer pela obediência às normas foto-clubistas então imperantes, quer pelo rompimento das mesmas. Hoje, devidamente emolduradas e dispostas em um ambiente que as reflete e endossa, reiteram a aparente falência dos constructos teóricos de Walter Benjamin, aqui comentados, em parte solapados pelos próprios fotógrafos, pelo mercado de arte e pelo colecionismo que conseguiram transformar aquelas peças em “quase” originais – objetos de deleite e de culto.

Tanto para aqueles que não se importam com tais questões, quanto para os que as consideram fundamentais para pensar sobre o estatuto da fotografia nos dias de hoje, Fotografia Moderna 1940-1960 é uma exposição obrigatória.

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Exposição reúne nove fotógrafos históricos

O Estado de S.Paulo
[Por Antonio Gonçalves Filho]
27 de junho de 2019


Composição da alemã Gertrudes Altschul feita com escova e pente

Composição da alemã Gertrudes Altschul feita com escova e pente


A mostra Fotografia Moderna 1940-­1960, que será aberta dia 29, sábado, na Luciana Brito Galeria, traz imagens de Thomaz Farkas e Gaspar Gasparian, entre outros

A arquitetura moderna da residência Castor Delgado Perez, projeto assinado em 1958 por Rino Levi (1901-­1965), é o cenário ideal para uma mostra como Fotografia Moderna 1940-­1960, que a Luciano Brito Galeria abre neste sábado, dia 29, em parceria com Isabel Amado. Foi exatamente no período final coberto pela mostra que Brasília começava a sair do papel e João Gilberto lançava a primeira gravação da bossa-­nova (Chega de Saudade, de 1958, mesmo ano da casa de Rino Levi). Com jardins projetados por Burle Marx e sua volumetria pura, a casa era o tipo de projeto arquitetônico que os fotógrafos experimentais da época adoravam registrar – e a exposição, com quase uma centena de imagens de nove fotógrafos, tem composições geométricas que usam edifícios modernos como modelos.

Hoje presentes nos acervos de grandes instituições internacionais, como o Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) e a Tate Modern de Londres, esses fotógrafos, de diferentes origens, tiveram em comum um clube de profissionais liberais que faziam experiências com fotografia, o Foto Cine Clube Bandeirante, fundado em 1939. Dos exemplos marcantes que participaram dele, Gaspar Gasparian (1899­1966), Geraldo de Barros (1923-­1998) e Thomaz Farkas (1924-­2011) são imediatamente associados ao experimentalismo que caracterizou a moderna fotografia brasileira dos anos 1940 em diante.

“Na época, os fotógrafos brasileiros estavam deixando para trás a referência pictorialista para enveredar por outro caminho”, lembra a curadora Isabel Amado. Um exemplo foi Gaspar Gasparian que, nascido no fim do século 19, se tornou conhecido como o introdutor da sintaxe visual moderna da chamada Escola Paulista, grupo informal ligado à estética da arquitetura brutalista. Contemporânea de Gasparian, a alemã Gertrudes Altschul (1904-­1962), uma das raras mulheres do Foto Cine Clube Bandeirante, tinha pelos edifícios modernos o mesmo apego, dedicando-­se a explorar a temática urbana, além de, a exemplo de Gasparian, fotografar objetos cotidianos e seus reflexos.

Dos nove integrantes da exposição Fotografia Moderna 1940-­1960, três vieram da Europa fugindo do nazi-­fascismo: a berlinense Gertrudes Altschul, o catalão Marcel Giró (1913-­2011) e o húngaro Thomaz Farkas. É possível identificar nas fotos dos três elementos da vanguarda europeia (o construtivista russo Rodchenko, em particular).

A exposição Fotografia Moderna 1940-­1960, além de fotógrafos internacionalmente reconhecidos, tem imagens que ajudaram a mudar o panorama de um país que abandonava seu passado colonial e ingressava na modernidade. Há nela fotógrafos como Thomaz Farkas que, em 1949, a convite do criador do Masp, Pietro Maria Bardi, realizou a primeira exposição de fotografia do museu, introduzindo sua linguagem abstrato-­geométrica ao público. É possível pensar em Farkas como um discípulo tardio de Rodchenko, mas seria injusto não citar a influência de outros vanguardistas – e o nome do seu patrício húngaro Moholy-­Nagy é incontornável quando se vê uma foto de Farkas como o um edifício visto em contra-­plongée sintetizado numa construção gráfica.

Outro exemplo anteriormente citado é o do catalão Marcel Giró, visto nesta página num autorretrato de 1953, ano em que abriu o próprio estúdio em São Paulo, tornando-­se pioneiro da fotografia publicitária no Brasil e mestre de fotógrafos como J.R. Duran e Márcio Scavone. Igualmente inspirado pelos grandes nomes do construtivismo e da Bauhaus, como Farkas, Giró foi, a exemplo de Gasparian, um pictorialista que trocou o realismo pelas composições de caráter experimental – como seu autorretrato diante de um prédio moderno.

A vocação dos fotógrafos ligados ao Foto Cine Clube Bandeirante era determinada, em certa medida, pelo convívio com artistas de formação ou diretamente ligados ao concretismo, sendo Geraldo de Barros o exemplo imediato dessa escola, expandido as fronteiras do processo fotográfico tradicional ao intervir diretamente nos negativos. É também um dos mais caros da exposição, que tem fotografias com preços variáveis entre R$ 13 mil e R$ 200 mil.

Ligado ao movimento concreto desde seus primórdios – o grupo Ruptura, de 1953, coordenado por Waldemar Cordeiro – o fotógrafo Ademar Manarini (1920-­1989), que foi industrial, como Geraldo de Barros, designer de móveis, tinha, como todos os fotógrafos da Escola Paulista, interesse na construção geométrica ao compor suas imagens. Prova disso é sua foto reproduzida a seguir (uma passarela no largo Ana Rosa em 1950). A multiexposição seria frequente na obra de Manarini – e essa foi uma característica dos fotoclubistas da época, sendo um dos expoentes do Foto Cine Clube Bandeirante Eduardo Salvatore (1914-­2006), representado na exposição com uma foto que integra o acervo do MoMA, Os Bancos (1960).


Foto do Largo Ana Rosa feita nos anos 1950 por Manarini

Foto do Largo Ana Rosa feita nos anos 1950 por Manarini


A mostra traz ainda fotografias de Mario Fiori (1908-­1985) e Paulo Pires (1928-­2015). O primeiro, filho de imigrantes italianos, foi alfaiate e enfermeiro, antes de se integrar ao Foto Cine Clube Bandeirante em 1948. É dele uma enigmática foto conceitual, Dia de Folga, que resume seu título numa corrente. Paulo Pires, na linha de Manarini, registrou a transformação da metrópole, mas não de forma documental. Suas imagens resultam de um sofisticado trabalho de composição.

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Fotografia Moderna 1940-1960

Arte que Acontece
[Agenda]
27 de junho de 2019



Pela primeira vez, reúne-se em um casa modernista em São Paulo – a residência Castor Delgado Perez, de Rino Levi, sede da Luciana Brito Galeria – um conjunto expressivo de fotografias de Geraldo de Barros, Gertrudes Altschul, Thomaz Farkas, Ademar Manarini, Paulo Pires, Marcel Giró, Gaspar Gasparian, Eduardo Salvatore e Mario Fiori, representantes da vertente moderna da fotografia brasileira, linguagem que mudou radicalmente o conceito do que é arte no universo da fotografia e das artes visuais. Realizada em parceria com Isabel Amado, a exposição “Fotografia Moderna 1940 – 1960” propõe-se, com suas mais de 90 obras, a reunir fotos inéditas e outras que ainda não circularam ostensivamente e que, portanto, não são tão conhecidas do público.

Com destaque para Geraldo de Barros, precursor do Concretismo no Brasil e cofundador do Grupo Ruptura, e Gertrudes Altschul, uma das poucas mulheres a ter a relevância de sua produção reconhecida neste período, a mostra espera contribuir, assim, para a ampliação do repertório visual que vem sendo construído em torno desses artistas. A fotografia moderna no Brasil aliou o desejo de inventividade e interpretação subjetiva do mundo no
contexto do pós-guerra às especificidades dos movimentos de industrialização e urbanização brasileiros. Impulsionado pela fundação do Fotocineclube Bandeirantes, em 1939, o cenário da fotografia nacional observou uma efervescência única a partir da década de 1940, quando seus representantes se afastaram do pictorialismo academicista e abriram uma discussão sobre a essência do fazer fotográfico e sua autonomia enquanto forma artística em si e por si.

Fotografia Moderna 1940-1960
Abertura: 29/06/19, 12h-18h
Visitação: até 07/09/19; terça a sexta, 10h-19h; sábado, 11h-18h
Luciana Brito Galeria: Avenida Nove de Julho, 5162, São Paulo. Entrada gratuita

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Poder e Sufocamento no MIS-SP

FHOX
[Exposições]
15 de agosto de 2017



Parte da coleção de fotografias da Fundação Marcos Amaro (FMA) ganha mostra em São Paulo

Desde que criou a Fundação que leva seu nome, em 2012, Marcos Amaro tem como objetivo levar a arte para todas as camadas da população, tanto por meio de suas produções artísticas como pelo acervo. A partir do dia 15 de agosto, parte de sua coleção de fotografias será apresentada pela primeira vez na exposição Poder e Sufocamento, no Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo.

Para selecionar 22 das mais de cem que compõem este acervo, Isabel Amado assina a curadoria. “É importante disponibilizar o acesso a esse conjunto que representa grande parte da produção contemporânea e que faz pensar sobre uma visão humanista das cidades”, afirma.

A primeira fotografia adquirida por Amaro, Mundo Injusto, de Luiz Garrido, foi também uma das três que norteou o recorte que a curadora propõe. Junto dela uma de Carlos Vergara e outra de Pedro David, que dão título à exposição. “Queremos induzir essa reflexão: Como lidar com esses dois estados, de poder e sufocamento?”, diz ela. Formando a narrativa visual entram então os fotógrafos: Armando Prado, Bruno Veiga, Cássio Vasconcellos, Claudio Edinger, Coletivo Garapa, Iatã Cannabrava, João Farkas, Julio Bittencourt, Marcel Gautherot, Marlene Bergamo, Nelson Kon e Tuca Vieira.

Amaro começou a colecionar fotografia em 2010 com o projeto “Trecho 2.8”, que tinha por objetivo resgatar a autoestima de adultos em situação de rua por meio da arte. “Aquele olhar deslocado que denunciava total vulnerabilidade social me chamou a atenção para a força que a fotografia podia ter como instrumento político de liberdade em deflagrar a opressão”, conta o colecionador. A partir daí, conheceu os trabalhos de artistas contemporâneos que dialogavam com essa questão estética e existencial.

A fotografia da favela de Paraísopolis, de Tuca Vieira, por exemplo, coloca em primeiro plano o contraste entre duas realidades: os prédios com piscinas e quadra de tênis e a comunidade, logo à frente. Repercutida no mundo todo, nem sempre com os créditos devidos ao autor, Tuca disse: “Essa foto talvez me faça atingir o que deveria ser o grande objetivo de um artista: provocar uma reflexão sobre o mundo e não sobre a obra e seu autor”. E essa talvez seja a melhor explicação também para se colocar um acervo “para passear”. “Minha maior intenção é demonstrar a potência do acervo fotográfico deflagrando espaços que tentam oprimir e diminuir a liberdade do indivíduo”, completa Amaro.

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Poder e Sufocamento | MIS

Dasartes
[Agenda]
15 de agosto de 2017


Parte da coleção da Fundação Marcos Amaro (FMA) será apresentada pela primeira vez com curadoria de Isabel Amado e fotógrafos como Cássio Vasconcellos, Iatã Cannabrava, João Farkas, Julio Bittencourt, Luiz Garrido, Marcel Gautherot, Pedro David e Tuca Vieira

Desde que criou a Fundação que leva seu nome, em 2012, Marcos Amaro tem como objetivo levar a arte para todas as camadas da população, tanto por meio de suas produções artísticas como pelo acervo. A partir do dia 15 de agosto, parte de sua coleção de fotografias será apresentada pela primeira vez na exposição Poder e Sufocamento, no MIS – Museu da Imagem e do Som, instituição da Secretaria da Cultura do Estado São Paulo, com entrada gratuita.

Para selecionar 22 das mais de 100 que compõem este acervo, Isabel Amado assina a curadoria. “É importante disponibilizar o acesso a esse conjunto que representa grande parte da produção contemporânea e que faz pensar sobre uma visão humanista das cidades”, afirma.

A primeira fotografia adquirida por Marcos, Mundo Injusto, de Luiz Garrido, foi também uma das três que norteou o recorte que a curadora propõe. Junto dela uma de Carlos Vergara e outra de Pedro David, que dão título à exposição. “Queremos induzir essa reflexão: Como lidar com esses dois estados, de poder e sufocamento?”, diz ela. Formando a narrativa visual entram então os fotógrafos: Armando Prado, Bruno Veiga, Cássio Vasconcellos, Claudio Edinger, Coletivo Garapa, Iatã Cannabrava, João Farkas, Julio Bittencourt, Marcel Gautherot, Marlene Bergamo, Nelson Kon e Tuca Vieira.

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Poder e Sufocamento no MIS

arte|ref
[Eventos]
15 de agosto de 2017


Mostra Poder e Sufocamento reúne acervo de fotografias contemporâneas no MIS 

Parte da coleção da Fundação Marcos Amaro (FMA) será apresentada pela primeira vez com curadoria de Isabel Amado e fotógrafos como Cássio Vasconcellos, Iatã Cannabrava, João Farkas, Julio Bittencourt, Luiz Garrido, Marcel Gautherot, Pedro David e Tuca Vieira

Desde que criou a Fundação que leva seu nome, em 2012, Marcos Amaro tem como objetivo levar a arte para todas as camadas da população, tanto por meio de suas produções artísticas como pelo acervo. A partir do dia 15 de agosto, parte de sua coleção de fotografias será apresentada pela primeira vez na exposição Poder e Sufocamento, no MIS – Museu da Imagem e do Som, instituição da Secretaria da Cultura do Estado São Paulo, com entrada gratuita.

Para selecionar 22 das mais de 100 que compõem este acervo, Isabel Amado assina a curadoria. “É importante disponibilizar o acesso a esse conjunto que representa grande parte da produção contemporânea e que faz pensar sobre uma visão humanista das cidades”, afirma.

A primeira fotografia adquirida por Marcos, Mundo Injusto, de Luiz Garrido, foi também uma das três que norteou o recorte que a curadora propõe. Junto dela uma de Carlos Vergara e outra de Pedro David, que dão título à exposição. “Queremos induzir essa reflexão: Como lidar com esses dois estados, de poder e sufocamento?”, diz ela. Formando a narrativa visual entram então os fotógrafos: Armando Prado, Bruno Veiga, Cássio Vasconcellos, Claudio Edinger, Coletivo Garapa, Iatã Cannabrava, João Farkas, Julio Bittencourt, Marcel Gautherot, Marlene Bergamo, Nelson Kon e Tuca Vieira.

Marcos Amaro começou a colecionar fotografia em 2010 com o projeto Trecho 2.8, que tinha por objetivo resgatar a auto estima de adultos em situação de rua por meio da arte. “Aquele olhar deslocado que denunciava total vulnerabilidade social me chamou a atenção para a força que a fotografia podia ter como instrumento político de liberdade em deflagrar a opressão”, conta o colecionador. A partir daí, conheceu os trabalhos de artistas contemporâneos que dialogavam sempre com essa questão estética e existencial. 

A fotografia da favela de Paraisópolis, de Tuca Vieira, por exemplo, coloca em primeiro plano o contraste entre duas realidades: os prédios com piscinas e quadra de tênis e a comunidade, logo a frente. Repercutida no mundo todo, nem sempre com os créditos devidos ao autor, Tuca disse: “essa foto talvez me faça atingir o que deveria ser o grande objetivo de um artista: provocar uma reflexão sobre o mundo e não sobre a obra e seu autor”. E essa talvez seja a melhor explicação também para se colocar um acervo “para passear”. “Minha maior intenção é demonstrar a potência do acervo fotográfico deflagrando espaços que tentam oprimir e diminuir a liberdade do indivíduo”, completa Marcos.

Sobre a FMA
A Fundação Marcos Amaro é uma organização cultural privada sem fins lucrativos. Como missão, tem o intuito de difundir a obra do artista Marcos Amaro, incentivar a produção artística contemporânea, acessibilizar o acervo e produzir conteúdo crítico a fim de investigar e documentar os caminhos da arte. Para isso, tem um criterioso programa de exposições, o edital anual de apoio a artistas, a premiação anual de destaque para melhor produção criativa, o estímulo à pesquisa acadêmica, além da promoção de debates e projetos especiais em espaços públicos.

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Farkas e outros grandes fotógrafos ganham mostra gratuita no MIS

Catraca Livre
[Agenda]
11 de agosto de 2017


Paraisópolis, 2004, de Tuca Vieira

Paraisópolis, 2004, de Tuca Vieira


Direto da Fundação Marcos Amaro para as paredes do Museu da Imagem e do Som (MIS), fotos de consagrados fotógrafos contemporâneos são exibidas na mostra Poder e Sufocamento, de 15 de agosto a 10 de setembro, com entrada Catraca Livre.

A exposição conta com 22 das mais de 100 fotografias que compõem o acervo da FMA, produzidas por nomes como João Farkas, Tuca Vieira e Claudio Edinger.

Obras de Luiz Garrido, Carlos Vergara e Pedro David foram escolhidas para nortear a mostra, que propõem um olhar sobre momentos de vulnerabilidade social e opressão, apresentando a força da fotografia como instrumento político de liberdade.

Entre os outros fotógrafos escolhidos para a exposição estão Armando Prado, Bruno Veiga, Cássio Vasconcellos, Coletivo Garapa, Iatã Cannabrava, Julio Bittencourt, Marcel Gautherot, Marlene Bergamo e Nelson Kon.

Talvez uma das fotografias mais icônicas é a da favela de Paraísopolis, em que Tuca Veira mostra o contraste entre duas realidades: os prédios luxuosos do Morumbi, com piscinas e quadras, e a comunidade, separadas apenas por um muro. Há mais de 15 anos, a imagem foi publicada na Folha de São Paulo e repercutida no mundo todo, e, agora, desembarca no MIS.

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Mais de 28 obras brasileiras entram para o seleto acervo de fotos do MoMA-NY

UOL
[Por Jotabê Medeiros]
2 de junho de 2016



O Museu de Arte Moderna de Nova York, o MoMA, acaba de adquirir 28 obras de fotógrafos modernos brasileiros para seu acervo, num lance ousado da curadora de fotografia do museu, Sarah Meister. Os trabalhos escolhidos são de Paulo Pires, José Yalenti, Ademar Manarini, Eduardo Salvatore, Marcel Giró (que era catalão) e Gertrude Autschul. A fotografia brasileira do período se aproxima da arte moderna e tem uma relação também com a escola de design Bauhaus, alemã. Mostram São Paulo em um momento de acelerada industrialização, com ousadas composições geométricas com formas urbanas e um novo senso dramático. A aquisição é significativa: o MoMA tinha até então apenas 70 fotografias de brasileiros em seu acervo, entre elas obras de Thomaz Farkas, Geraldo de Barros, Sebastião Salgado, Valdir Cruz e Nair Benedicto.

A curadora brasileira Isabel Amado, que representa seis famílias desse grupo de fotógrafos, encontrou-se com Sarah Meister no ano passado durante exposições, e ela pediu para conhecer o acervo de Isabel. Sarah então levou os trabalhos para a apreciação do conselho do MoMA, que aprovou a compra em maio. Pelo contrato, o valor não pode ser revelado.

Sarah Meister já examinava os trabalhos desse grupo desde 2013, quando viu a mostra de Marcel Giró na Galeria Bergamin, no Rio; e a exposição Paulo, José e Ademar, na SP Arte daquele ano. A norte-americana demonstrou encantamento com o fato de que a fotografia brasileira desse segmento demonstrasse uma relação tão próxima com a americana. Ela acredita que esses trabalhos podem mesmo ajudar a redefinir a historiografia da fotografia do período - essa tese estará na mostra Photography at MoMA: 1920 to 1960, que incorporará os trabalhos recém-adquiridos dos brasileiros, no ano que vem.

Sarah destaca a linguagem experimental e a criatividade dos artistas, além o fato de que eram um grupo, e não apenas uma pessoa, desenvolvendo esse trabalho naquela época. Quase todos os artistas selecionados pelo MoMA integraram o mítico Cine Foto Clube Bandeirantes, confraria de fotógrafos de vanguarda cujo início remonta a 1939. Além dos mencionados acima, havia os nomes de German Lorca, Gaspar Gasparian, Thomaz Farkas e Geraldo de Barros. A curadora do MoMA ficou também impressionada que algo que era como um hobby para aqueles profissionais (dentistas, advogados e profissionais liberais) tivesse se convertido em uma fotografia tão potente.

“Eu acho fascinante que algumas fotos adotam uma óbvia linguagem experimental, solarização (exposição do filme por alguns momentos no processo de revelação), impressão de negativos, abstração, pontos de vistas dramáticos. Isso é maravilhoso. Mas é igualmente maravilhoso que haja nessas fotos uma linguagem que é chamada nos Estados Unidos de 'fotografia criativa', algo que opera num nível mais não convencional da linguagem humanizada, pessoas e figuras nas ruas e no ambiente urbano numa espécie de expressão criativa, que eu acho fantástico. E não é só uma pessoa que faz um tipo de coisa, e outra pessoa que faz outra. Esses grandes fotógrafos cruzaram essas fronteiras, e eu acho fascinante”, disse a curadora sobre os trabalhos.

O brasileiro Iatã Cannabrava iniciou o trabalho de resgate desse grupo, que culminou com a aquisição pelo Museu de Arte de São Paulo (Masp) de 275 fotografias em regime de comodato, em 2014. Isabel Amado, que negociou os trabalhos com o MoMA por meio de sua empresa, a Anima Montagens, possui ainda mais de cem fotos desses artistas.

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Julio Bittencourt registra resquícios de afeto em ilha fantasma do Japão

O Globo
[Cultura]
6 de maio de 2016


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Fotografias da exposição Kamado falam de ausência em área abandonada há 40 anos

Todos os milhares de apartamentos na ilha de Hashima, no sul do Japão, são iguais em seu espaço econômico, sob medida para abrigar famílias de operários que trabalhavam na extração de carvão em minas submarinas. Comprada pela Mitsubishi Corporation em 1890, no início do processo de industrialização do país, a ilha de menos de 1 km2 de área chegou a ter mais de 5.200 moradores em imensos blocos de concreto (só um dos prédios possui 317 unidades). Mas, em 1974, a empresa interrompeu suas atividades na área, evacuando a ilha. Desde então, as construções vêm se deteriorando, e as moradias, abandonadas, diferenciam-se entre si ao revelar, em pequenos objetos, a ausência de seus ocupantes.

É nesse pedaço de terra em ruínas, usada como cenário para o vilão de Javier Bardem em 007: Operação Skyfall (2012), e declarada pela Unesco, em 2015, Patrimônio Mundial, que o fotógrafo paulistano Julio Bittencourt, 35 anos, encontrou o material para a exposição Kamado, em cartaz desde ontem na Galeria da Gávea. Ele vira fotos dos destroços num blog de turistas americanos, identificando os elementos que buscava para uma série que produzia então. Tentou em vão, junto a autoridades japonesas, autorização para trabalhar de madrugada (a série Algumas coisas se perdem para nunca mais serem encontradas pedia longas exposições noturnas). A falta de respostas levou-o a peitar a empreitada.

Com a ajuda de um produtor japonês, comprou num leilão em Tóquio um bote da guarda costeira, e desembarcou no local clandestinamente no fim de 2013. Durante 40 dias cumpriu a mesma rotina: era deixado ali, sozinho, de manhã, por períodos de 48 horas. À noite, fazia as fotos previstas. Durante o dia, andava pelos escombros da cidade-fantasma, e, ao percorrer o prédio mais alto da ilha, de nove andares, vislumbrou a série de fotos que apresenta agora.

— Vi as cozinhas abandonadas, todas absolutamente iguais, mas cada uma com resquícios dos moradores: tigelas, chaleiras, as paredes descascadas. Ficou claro que havia ali um novo trabalho. A leitura mais direta das fotos é a do abandono, da memória. O que a gente leva com a gente e o que a gente deixa para trás. Mas para mim fala de família, de afeto. A cozinha é onde as pessoas se reúnem.

Kamado é o fogão tradicional japonês, alimentado por carvão. Nas fotos de Bittencourt, eles ganham uma luz tênue vinda do exterior. Isabel Amado, curadora da mostra, chama a atenção para o fato de que esta é a primeira série do fotógrafo depois de várias em que havia a presença da figura humana, como Numa

janela do edifício Prestes Maia, 911 (que lhe rendeu o prestigioso Oskar Barnack Prize, da Leica, em 2007), Cidadão e Ramos — esta última, um surpreendente retrato dos frequentadores do Piscinão de Ramos, no Rio. Em Kamado, a presença se faz pela memória que não pertence mais aos que viveram ali — “Elas compõem um novo corpo, um outro indivíduo”, observa Isabel.

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